Esta página “web” traz a parte da Hipermédia do meu trabalho de doutoramento que é discutir como o hipermédia e a análise paradigmática podem auxiliar em uma nova perceção das obras “Der Hirt auf dem Felsen” de Franz Schubert e Sonata para clarineta e piano de Francis Poulenc.
O termo multimédia é o desenvolvimento, a integração e a utilização de várias formas de médias (imagem, texto, som e animação e vídeo). Podemos perceber melhor a integração destas médias com a evolução dos navegadores de Internet que permitiu a integração destes elementos no que chamamos hipermédia.
A Hipermédia, segundo Sawaya (2002) é um:
Termo que descreve aplicações de multimédia interativas, e não sequenciais, que possuem ligações de hipertexto entre diversos elementos, como texto, gráficos, ilustrações, sons, vídeos e animações. É a tecnologia, ou o seu produto, que combina as propriedades do hipertexto (a navegação não linear por meio de um documento ou sistema) com as da multimédia (textos, imagens, sons, etc.) (p. 220)
Em outras palavras, a hipermédia é a fusão do hipertexto e as multimédia (texto, gráficos, ilustrações, sons, vídeos e animações). Sawaya (2002) define hipertexto como “a possibilidade de ver um ou mais documentos em qualquer ordem sem precisar seguir uma sequência. Permite saltar, a partir de uma palavra, frase ou assunto, para outro texto com assuntos relacionados ao tema inicial. Muito usado em multimédia”. (p.220) ou seja, são palavras que possuem ligações e permitem “pular” para outros textos ou parágrafos com conteúdo extensivo a palavra original sem que tenha uma leitura serial.
Este recurso deu origem a documentos HyperText Markup Language – HTML (Linguagem de Marcação de Hipertexto) o qual é uma linguagem baseada na marcação de hipertextos onde criamos programas que trabalham com textos e imagens numa mesma tela simultaneamente. Por sua vez, documentos HTML é a base para construção de páginas “Web”.
Na análise musical, alguns aplicativos foram criados para auxiliar instrumentistas e musicólogos nas suas análises musicais. Contudo, as ferramentas apresentadas utilizam o eixo horizontal (sintagmático) para apresentar os elementos e nenhum deles permite a tabulação, bem como o alinhamento de elementos paradigmáticos.
Uma tentativa de criar uma ferramenta hipermídia chamada de Score Charter (elaborado entre 2005 – 2008) para análise de música que permitem a inclusão de anotações codificadas nas apresentações analíticas, que substituem os exemplos musicais tradicionais que se colocam em um texto foi desenvolvida por Donin & Goldman (2008). Contudo, eles levantam a necessidade de inovação no algoritmo com adição de etapas automatizadas da análise ou permitir essa automatização por aplicativo de terceiros. Há problemas na sincronização entre partitura escrita e o áudio, dado que o aplicativo não permite a alteração de dados após a conclusão dessa etapa. O alinhamento dos fragmentos são restritos, visto que não permite a manipulação espacial destes fragmentos. Outra sugestão para o aprimoramento do “software” seria a criação de regras que permitissem a mudança de classificação dos paradigmas (seja por duração, intervalos, rótulos semânticos que possuem, entre outros) de forma que produzir automaticamente diferentes categorias de gráficos.
Além disso, o “ActionScript” é uma linguagem de programação que a empresa Adobe mantinha no seu produto chamado “Flash” usado para criar animação baseada em gráficos vetoriais. Essa linguagem chegou até a versão 3. Todavia, a empresa anunciou os seus planos para acabar com o suporte à tecnologia em 2020. Tal fato tornou o“ActionScript” e todo o seu ecossistema obsoleto.
A partir deste ponto, surgiu a ideia de desenvolver uma aplicação que facilitasse o processo de segmentação e de diagramação da tabela paradigmática com poucos cliques numa partitura e permitisse ouvir os elementos entabulados tanto sintagmaticamente quanto paradigmaticamente.
O aplicativo desenvolvido não tem a pretensão inicial de criar análises paradigmáticas automatizadas, mas sim de facilitar a confeção do diagrama (a partir de marcações manuais dos paradigmas num editor que tivesse como “interface” um navegador de Internet) e exibição de tabelas paradigmáticas (por meio dos recursos da Hipermédia). Além disso, permite a impressão e a exportação da imagem deste diagrama. Tudo isso acessível a partir de um navegador de “Internet” sem instalação de “plug-in” adicional ou programas.
A escolha linguagem de programação está ligada ao meu conhecimento e domínio das linguagens que permitisse manipular os elementos no navegador e trabalhar com bancos de dados no servidor. As linguagens utilizadas foram JavaScript e PHP respetivamente. O outro desafio foi escolher um sistema de notação musical baseado em marcadores de texto, assim como são os documentos “HTML”. Entre outros sistemas para notação de partitura, os mais viáveis foram três: “ABC Notation”, Lilypond e musicXML. Neste trabalho foi escolhido sistema de notação ABC (“ABC Notation”) com o motor de renderização o abcjs.
A revolução eletrónica advinda da década de 1950 aliada a evolução digital e computacional na virada do século XXI foram tecnologias disruptivas responsáveis por transformar o modo de como ouvimos, percebemos e fazemos música.
A musicologia não ficou alheio a essas tecnologias ao adotar a musicologia computacional. A musicologia computacional, segundo (Kröger et al., 2008, p. 542), “é definida a grosso modo como o estudo de música com a auxílio de programas de computador”.
As análises auxiliadas por computador “é importante porque pode ajudar a identificar elementos musicais em um grande corpus musical em um tempo curto”. (Kröger et al., 2008, p. 542)
Por sua vez, a hipermédia aproxima a associação (texto – música - áudio) e permite uma intersemiose entre os elementos visuais (partitura), textos e o áudio.
Segundo Martinez (2005)
[…] as tecnologias digitais, se observa uma equivalência a nível profundo na organização das diversas artes que compõem a multimídia e a hipermídia computadorizada. Tanto a música como as imagens e textos são arquivos digitais em códigos intrinsecamente equivalentes, captados e editados por meio de programas que manipulam esses arquivos de acordo com funções lógicas e protocolos computacionais. (p. 172–173)
Em outros termos, a hipermédia torna-se diferente porque há uma significação intrínseca na intencionalidade mediante as escolhas semióticas que o criador optou para dar significado ao objeto, bem como na forma de tratar e montar os signos dos materiais mediáticos tal qual pode suprimir o interprete.
Um mesmo objeto pode ser representado por tipos diferentes de signos. Isso quer dizer que aspetos diferentes serão enfatizados, assim como essas referências implicam diferentes possibilidades de interpretação. Como Peirce previu, trata-se de uma retórica, pois o estudo da referência multimidiática implica o estudo dos modos elegidos de significação de um objeto, escolhas que influenciarão as leituras, ou os interpretantes dinâmicos de um possível espetador. (Martinez, 2004, p. 178)
A divulgação dos resultados de uma investigação baseada na análise musical, seja por qualquer media, é a compilação de um conhecimento. Por sua vez, a hipermédia permite a perceção da informação diretamente.
Assim, a análise paradigmática é o método no qual musicólogos buscam perceber e compreender as relações entre as partes do objeto segmentado, permitindo que o interprete possa ressignificar o discurso sonoro. A Hipermédia é uma ferramenta permite uma interação e semiose direta entre o objeto e o investigador.
Nesta pesquisa, durante o processo de análise, discuto sobre a segmentação e a organização dos paradigmas de modo a responder as seguintes perguntas: Qua(is)l modelo(s) paradigmático(s) permitem criar relacionamentos e conhecimento de uma obra de forma auxiliar na compreensão da mesma? Como a análise paradigmática pode revelar conexões melódicas, harmónica, rítmicas, texturas ou semânticos?
Os principais resultados foram: faz-se necessário o uso de outros métodos analíticos para além do paradigmático para analisar uma obra que não seja uma melodia isolada (monódia). No processo de segmentação de uma melodia, o uso de diferentes abordagens e critérios trará outros olhares ao resultado da análise. Na maior parte dos casos, a divisão formal das obras mudaram a partir de algumas características utilizadas na organização do paradigma.
Ao criar uma tabela paradigmática com pequenos trechos de cada movimento, observou-se um resultado melhor do que analisar o movimento inteiro. No processo de fragmentação, os segmentos maiores foram melhores para analisar do que partes muito pequenas.
Apesar de não haver ainda estudos sistematizados sobre a eficácia do hipermédia no estudo interpretativo de uma obra, a utilização da Hipermédia traz ao musicólogo, ao investigador, aos músicos, aos instrumentistas ou ao musicófilos a possibilidade de perceção mais direta, uma vez que o hipermédia não se limita a leitura da partitura em papel, mas permite a junção do áudio, texto, vídeos e outros recursos, além da partitura.
Para demonstrar a utilização da hipermídia como ferramenta facilitadora da percepção de uma obra musical a partir da análise paradigmática, faremos a análise de duas obras “Der Hirt auf Dem Felsen” de Schubert e Sonata para clarineta e piano de Francis Poulenc.
Em cada página, observaremos várias análises paradigmáticas da obra escolhida. Haverá análises que não foram utilizadas no trabalho, mas foram relevantes no processo de análise. Será possível ouvir cada fragmento ao clicar duas vezes no fragmento. Se o ponteiro do rato estiver sobre um fragmento, uma caixa com anotações sobre o fragmento aparecerá. Ao clicar duas vezes sobre a letra da coluna ou da linha o usuário ouvirá a coluna paradigmática ou a linha sintagmática.
O áudio utilizado nas amostras foram retirados das seguintes mídias:
Duo Cernavca. (2018). Sonata Pour Clarinette e Piano — Francis Poulenc [Faixa de Áudio].
Mühlemamann, R. (2019, novembro 8). Der Hirt auf Dem Felsen—Franz Schubert [Faixa de áudio].
Abaixo, segue cinco hiperligações:
Évora, 28 de junho de 2024
Daniel Souza de Araujo